terça-feira, 20 de agosto de 2019

A tal da chupeta e o que ninguém tem coragem de falar: um relato de confusão de bicos

A tal da chupeta e o que ninguém tem coragem de falar

Esse texto foi escrito por mim, Anne, quando Arthur tinha 9 meses, chupava chupeta e de cara apresentou sinais avançados de confusão de bicos. O objetivo, na época, era postar nos grupos pró-amamentação para conseguir ajuda. Não tive coragem de escancarar minha intimidade e meus sentimentos. Hoje, me sinto mais confiante e com a missão de alertar outras mães. Arthur está com 1 ano e 8 meses (completa hoje), é amamentado e o vínculo se fortalece a cada dia.

Bicos artificiais como a chupeta podem causar confusão de bicos, impedindo a amamentação e causando desmame precoce. O choro do bebê e a recusa de ser amamentado ao seio podem ser sinais de confusão de bicos.
A recusa do bebê, o choro excessivo e a dificuldade de ser amamentado no seio podem ser indícios de confusão de bicos.

Antes de mergulharmos na minha experiência com a chupeta e a confusão de bicos que ela causou no meu filho Arthur, quero compartilhar algumas informações importantes sobre este assunto. Como mãe, acredito que é essencial estar informada e preparada para as complexidades da maternidade, especialmente quando se trata de algo tão delicado quanto a amamentação.

Confusão de Bicos: O que é?

A confusão de bicos ocorre quando um bebê tem dificuldade em alternar entre a amamentação no seio e o uso de bicos artificiais (como chupetas ou mamadeiras). Do ponto de vista fisiológico, isso acontece porque os músculos e movimentos utilizados para a sucção em cada um desses métodos são diferentes. No seio materno, o bebê realiza um movimento mais complexo, envolvendo a sucção profunda e a compressão da aréola, enquanto nos bicos artificiais, a sucção é mais superficial e menos complexa.

Dados sobre Amamentação

Um desafio significativo para a continuidade da amamentação exclusiva é o uso de bicos artificiais. No Brasil, metade das crianças de até dois anos usa mamadeiras, chuquinhas e chupetas​​. Essa prática pode interferir na amamentação exclusiva e causar a confusão de bicos. Além dos benefícios para os bebês, a amamentação também traz vantagens significativas para as mães, incluindo a redução do risco de desenvolvimento de câncer de útero e de mama​​​​.
  • Amamentação no Brasil: Segundo o Ministério da Saúde do Brasil, a taxa de amamentação exclusiva em crianças menores de 6 meses tem aumentado ao longo dos anos. No entanto, a introdução de bicos artificiais ainda é um desafio, pois muitas vezes é associada a uma menor duração da amamentação exclusiva. No Brasil, a taxa de amamentação exclusiva em bebês com até seis meses é de 45,8%​​​​. Isso indica que menos da metade dos bebês nessa faixa etária são alimentados exclusivamente com leite materno. 
  • Amamentação no mundo: A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda amamentação exclusiva até os 6 meses de idade e continuada até os 2 anos ou mais. No entanto, globalmente, apenas cerca de 40% dos bebês menores de seis meses são amamentados exclusivamente. Nos Estados Unidos, a taxa de amamentação exclusiva até os seis meses é relativamente baixa quando comparada com as recomendações globais. De acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), apenas 25% dos bebês são amamentados exclusivamente até os seis meses de idade. Fatores culturais, a curta duração da licença maternidade e a prevalência de mitos e equívocos sobre a amamentação podem contribuir para essas taxas mais baixas. Por outro lado, países como a Noruega apresentam taxas significativamente mais altas de amamentação exclusiva. Na Noruega, mais de 70% dos bebês são amamentados exclusivamente até os seis meses. Políticas de apoio à maternidade, como licenças maternidade e paternidade generosas e um forte sistema de apoio à saúde, desempenham um papel crucial nesses altos índices. Enquanto nos EUA a licença maternidade é frequentemente curta e sem remuneração, na Noruega, as famílias têm direito a licenças remuneradas extensas, além de um robusto suporte de saúde pública, o que facilita e incentiva a amamentação exclusiva por mais tempo.
  • Meta da Organização Mundial da Saúde: A meta estabelecida pela OMS é aumentar em 50% a taxa de aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida até 2025​​. Isso reflete o esforço global para incentivar a prática da amamentação exclusiva.

Impactos da introdução precoce de bicos artificiais

Estudos indicam que a introdução precoce de bicos artificiais pode levar a uma redução no tempo total de amamentação. A OMS e o UNICEF recomendam evitar o uso de bicos artificiais para promover a amamentação exclusiva. A introdução de bicos artificiais tem sido associada a uma maior incidência de desmame precoce.

Rejeição do seio e preferência pelo bico artificial

Estudos indicam que bebês expostos precocemente a bicos artificiais podem desenvolver preferência por esses devido à menor exigência de esforço para sucção. Diferentemente do seio, onde o bebê precisa de uma combinação de sucção, compressão e movimentos peristálticos da língua, os bicos artificiais liberam o leite com menos esforço. Esse contraste pode levar à preferência pelo bico artificial e rejeição do seio.

Alteração na técnica de sucção e problemas na pega

A mecânica da sucção é significativamente diferente entre o seio e os bicos artificiais. No seio, o bebê precisa abrir amplamente a boca, criar um vácuo e utilizar a língua de forma ativa para extrair o leite. Com bicos artificiais, a língua desempenha um papel menos ativo, e a sucção é frequentemente mais superficial. Essa diferença pode levar a uma pega inadequada quando o bebê retorna ao seio, resultando em dor e possíveis lesões para a mãe, além de uma extração ineficiente do leite.

Diminuição da produção de leite

A produção de leite materno funciona em um sistema de oferta e demanda. Quando a sucção é menos frequente ou ineficiente devido à confusão de bicos, pode ocorrer uma diminuição na produção de leite. Isso é especialmente crítico nos primeiros meses de vida do bebê, quando a amamentação é a principal fonte de nutrição. Estudos mostram que a redução na estimulação do seio pode levar a uma menor produção de leite, comprometendo o crescimento e desenvolvimento do bebê.

Impacto emocional na mãe e no bebê

A amamentação é mais do que uma forma de alimentação; é um momento de vínculo e conexão entre mãe e filho. A confusão de bicos pode trazer estresse e ansiedade para a mãe, que se preocupa com a alimentação e o bem-estar do bebê. Para o bebê, a rejeição do seio pode resultar em frustração e irritabilidade, afetando seu estado emocional e bem-estar.

Conclusão e reflexão pessoal

Como mãe que passou por essa experiência, sei o quão desafiador pode ser navegar por essas águas turbulentas da amamentação. Meu relato a seguir reflete não apenas as dificuldades enfrentadas, mas também o aprendizado e a resiliência desenvolvidos ao longo dessa jornada.

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Meu relato pessoal de confusão de bicos causada pela chupeta

 

Preciso de ajuda.

Preciso começar dizendo que "eu sabia". Eu sabia que poderia causar desmame precoce, eu sabia que uma hora ou outra ele poderia rejeitar o peito, eu sabia que "ela" poderia nos causar problemas. Só não achei que seria tão doloroso para mim. 

A chupeta.

Eu dei. Mesmo conhecendo os riscos. Eu dei, consciente (será? Hoje questiono). Eu dei num momento de total fragilidade física, emocional, espiritual (não quero me justificar, mas quero explicar). 

Tive tireoidite pós-parto com hipertireoidismo, então o cansaço normal do pós parto era multiplicado. Eu não tinha energia para nada. Emagrecia mesmo comendo o mundo. Estava exausta. Um bebê que não dormia por nada durante o dia e acordava 8-12x na noite (chegou a acordar 18x váááários dias). Longe da família, marido o dia todo fora, sozinha com um bebê e a casa para cuidar. Porém meu bebê sempre negou a chupeta. Com 5 meses, os dentes nascendo, no auge no desespero, privação total de sono, com os hormônios da tireóide fora do controle e com um ultimato do pediatra pró amamentação (será?), dei a chupeta. Na verdade dei sem pretensão, achei que ele iria apenas morder. Mas ele chupou! Foi um misto de alívio com desespero. Dei a chupeta porque achei que estava escolhendo um mal menor. Eu pensei: melhor a chupeta do que a mamadeira com fórmula (sugestão do pediatra que queria que eu tratasse imediatamente a tireóide e que desconhecia que os medicamentos eram SIM compatíveis com a amamentação).

Achei que por ter informação e conhecer os sintomas de confusão de bicos, eu saberia intervir e que seria muito simples retirar a chupeta caso a confusão de bicos acontecesse (#SQN).

Vale dizer aqui que a chupeta ajudou muito pouco, se é que ajudou em algo. Ao mesmo tempo que acalma ele para conseguir relaxar e dormir (única "vantagem" que percebi), durante o sono ele perde inúmeras vezes a chupeta e continua acordando porque a chupeta caiu da boca. O choro? Não diminuiu. É, o bebê tem a capacidade de chorar com a chupeta na boca. Isso quando ela não cai, literalmente, de minuto em minuto. "Ahhh, mas o bebê mesmo consegue colocar a chupeta na boca. Não, colega. Sabe com quantos meses ele vai adquirir essa habilidade?" Arthur com 9 meses ainda não consegue. Quem dirá no meio da noite, no escuro.

Há cerca de 3 semanas atrás, os dentes incisivos centrais superiores dele começaram a machucar meu seio direito (justamente o lado que mais produz). Uma colega me alertou sobre a pega, mas achei que não fosse isso, pois eu achava que a pega não havia mudado, apenas os dentes haviam nascido. Com muito lanolina + paciência, resgatei a almofada de amamentação, o contato barriga com barriga e arrumamos a pega. Rapidamente o peito cicatrizou e prosseguimos com a amamentação, achando que a chupeta não era a culpada. 

Do nada, há poucos dias atrás, ele passou a fazer ânsia de vômito com o peito. Isso dilacerou meu coração. Como estava calor + dentes nascendo + falta de apetite, tentei me convencer de que novamente a chupeta não era a culpada. Ele passou a fazer greve de amamentação, no auge de seus 9 meses. Como sempre mamou apenas leite materno, na hora do fome, ele contornava a ânsia e mamava. Mas apenas o suficiente para saciar a fome, penso eu. De madrugada continuava mamando normal. Apetite para comida também está bastante reduzido, mas aí penso que há uma associação direta com a dentição.

Quando grávida, não tinha grandes aspirações em relação à amamentação. Tinha como objetivo a amamentação exclusiva até os 6 meses, a partir daí, o que viesse seria lucro. Não achei que iria amar tanto amamentar, que seria um momento tão lindo e de total entrosamento com meu filho. 

Eventualmente ele também bebe água num copo que tem bico de silicone, mas como também bebe água em copo normal, esse bico de silicone vai já pro lixo.

Não encontrei nenhum relato de bebê maior com confusão de bicos em relação à chupeta. Tenho total apoio do marido. Ele é firme e não se incomoda com o choro do bebê. Já eu, sofro muito. Arthur já sabe pedir pelo bico e negá-lo me entristece muito. Porém sei que é necessário, serão alguns dias difíceis, mas talvez eu consiga.

Não notei (ainda) diminuição na produção de leite (provavelmente porque ele ainda mama várias vezes de madrugada). Passo o dia em função do bebê, não estou trabalhando no momento.

Enfim... consigo reverter a situação? Sei que estamos tendo sinais muito graves de confusão de bicos.

De todo o coração, peço empatia, principalmente às minhas amigas que estão lendo este post, e que me avisaram de que isso poderia acontecer. Vocês me acompanharam e sabem o que eu passei. 

Muito obrigada e um abraço.

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